Teve lugar em Minniapolis (MN, EUA) no icónico Bruininks Hall, em 18 e 19 de Junho do corrente, a terceira reunião do PMIG the Physiology Majors Interest Group , criado no contexto a APS (American Society of Physiology) criado pelos principais departamentos de Fisiologia do continente americano (Canada incluído) para reforçar o caracter de qualidade e excelência da Fisiologia, considerada essencial para qualquer profissão de saúde.
A SPF entrevistou Luis Monteiro Rodrigues, membro deste grupo desde a sua fundação e que, nesta reunião coordenou um “focus group” sobre o futuro da Fisiologia.
Aqui ficam algumas das notas mais relevantes.
LMR. É verdade, os sistemas são diferentes , formam com objectivos distintos razão pela qual o ensino da Fisiologia tem , nos EUA, uma importância e um carácter muito vincados.
Devo salientar que em Portugal há agora uma profissão próxima na designação, a Fisiologia Clínica, ministrada por algumas escolas do Politécnico, cuja criação introduziu uma outra contextualização da Fisiologia em Portugal ainda por discutir, quer do ponto de vista dos conteúdos quer do ponto de vista das competências.
Mas, voltando à pergunta, as preocupações são essencialmente as mesmas. Apesar de os majors de Fisiologia nos EUA terem ganho um dinamismo impressionante nos últimos anos, tornando-se uma área de formação superior muito competitiva. Contudo, os cursos são muitos diferentes uns dos outros. Muitos destes departamentos (com denominações muito variadas) estão em Escolas de Arte, outros em Escolas de Ciência. Contudo, há uma constatação geral de que no final 3 ou 4 anos do curso, cerca de 50% dos alunos não continua os seus estudos, preferindo ingressar na via profissional, revelando alguma inconsistência com os objectivos iniciais declarados pelos alunos – as escolas superiores de saúde.
Na Europa, a Fisiologia é uma disciplina transversal a todos os cursos de saúde. Não tanto uma área de desempenho profissional, apesar do exemplo recente que citei. Por outro lado, na investigação e no ensino avançado, há muitos fisiologistas a desenvolverem esta ciência básica com projectos e publicações de grande qualidade.
O PMIG foi criado para discutir como reforçar o caracter de formação em fisiologia, já que as escolas americanas (cerca de 20) formam profissionais com competências muito distintas . Discutir os conceitos centrais, a adaptação do ensino aos novos desafios (públicos, tecnologias) e antecipar o futuro foram temas principais neste encontro.
SPF. Existe algum paralelo entre este PMIG e algumas estruturas europeias? nacionais ou internacionais?
LMR. A nível nacional, como é publico, Portugal é (era) o único País da UE sem uma Sociedade de Fisiologia reconhecida pela federação europeia (FEPS) ou pela União Internacional (IUPS). Especial destaque é devido nestes domínios à APS , à Physiological Society (UK) e à IUPS que, de múltiplas formas, têm liderado os acontecimentos globais nestes dominios. Todas têm procurado refletir sobre as dificuldades que, em particular na UE temos sentido em atrair novos fisiologistas para o desenvolvimento de conhecimento avançado de natureza biomédica.
Temos perdido alguma relevância para disciplinas como a bioquímica, a biologia celular e molecular. Mais recentemente, a inteligência artificial e a robótica têm chamado a atenção para as ciências básicas. Mas é verdade que temos um longo caminho a percorrer sobretudo nos países fora da Grã-Bretanha, para atingir os níveis de notoriedade que a fisiologia goza nesses países (a ultima reunião conjunta da APS e da Physiological Society, em 2016 reuniu quase 4000 fisiologistas de todo o mundo, em Dublin).
SPF. Que participação teve neste PMIG?
LMR. Como sugerem as minhas respostas, há muito que procuro contribuir para pensar e agir nestes domínios, conhecendo o que se faz em fisiologia humana no País e fora dele. O laboratório que dirijo (Modelação de Sistemas, do centro CBIOS) tem desenvolvido alguma investigação básica que procuramos divulgar nas grandes reuniões do sector . Por ocasião da construção do Physioma 2019 pensámos discutir o “futuro da Fisiologia” com um painel de especialistas relacionados com esta actividade. Daí para o “focus group” nos EUA e depois em Portugal (ainda por fazer por questões de calendário) foi um passo natural.
O que fizemos foi discutir abertamente (brainstorming) com alguns dos mais notáveis fisiologistas norte americanos (incluindo um Arthur C.Guyton Award) as tendências, os fatores de incerteza e os possíveis cenários de evolução da Fisiologia, do seu ensino e investigação, e antecipar potenciais cenários num horizonte a 10 anos (2030). Tive o gosto especial de desenhar com o colega João Gregório, e moderar esta sessão. Estamos muito curiosos com os resultados.
SPF. Qual a sua expectativa para a Sociedade de Fisiologia?
LMR. Creio que surge num momento muito oportuno. Há grandes mudanças – tecnológicas, culturais, sociais, cujo impacto global não podemos prever . Mas sabemos que é preciso preparar a fisiologia e os futuros fisiologistas para múltiplos desafios. A sociedade pode estreitar a distancia entre as diferentes realidades – proporcionar o contato com novos conceitos / técnicas de aprendizagem activa aplicada em fisiologia; mostrar a importância do coaching na formação do futuro fisiologista, facilitar o networking, e a mobilidade dos investigadores… Há muitas novidades que aqui chegam sempre com um atraso que diria “histórico”. Apesar de tudo … sempre assim foi. Creio que com a sociedade, ou seja, com a colaboração daqueles que vivem o ensino e a investigação em fisiologia com paixão, que teremos condições para fazer mais e melhor.